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Posso dizer que em 80% da minha vida me senti feia, ou no máximo aceitável. Desde pequena sou gorducha, e isso logicamente sempre me rendeu muitos apelidos. "Gorda baleia, saco de areia" falado cantadinho por colegas. Gorda e baleia era apenas o básico, o pessoal tem uma criatividade incrível.
Fui crescendo e ficando cada vez mais no meu canto. Até a 8ª série lembro de ser aquela aluna quietona, estudiosa, que se dava bem com a maioria dos colegas, mas só podia chamar de amigos uns poucos. Nunca fui de me abrir com absolutamente ninguém. Meus sentimentos eram meus demais pra compartilhar. Ninguém vivia a minha realidade. Minhas colegas, todas com peso normal ou até magras demais, mas gorducha era só eu. Sempre. E quando alguém resolvia me provocar, já sabia como.
Sempre fui descuidada comigo mesma. Meus seios cresceram muito rápido, menstruei um mês antes de completar 11 anos, ou seja, além de gorda, era peituda e totalmente fora do padrão dos demais colegas. Vivia me escondendo dentro de blusas e calças largas, tênis masculino. Minha mãe insistia em me vestir como menina, sem sucesso. Tive minhas paixonites, mas sempre em segredo. Nunca achei que podia ser amada pelo que eu era. Vivia de cabelo solto, porque achava que com cabelo preso ficava mais gorda ainda. Um dia, na 7ª série, prendi o cabelo e ganhei um novo apelido: "Colinha". De cola = rabo de cavalo. O pessoal curte apelidar, mas esse nem liguei. Se discutisse com alguém, fato raríssimo, visto que eu não era vista nem o suficiente para arrumar confusão, a primeira coisa era atacarem meu excesso de peso.
Quando mudei de escola, de turma, de ares, me soltei um pouco mais. Fiquei mais falante, foi como ter um recomeço. Fiz novas amizades e me abri um pouco mais. Mas ainda seguia me achando feia, desarrumada, e com o coração fechado. Tanto que até poucos dias após completar 18 anos, nunca sequer havia beijado um guri. E quando beijei, foi meio que por obrigação de tirar esse "estigma" de nem saber o que era isso. Minha melhor amiga, que era parecida comigo (gorducha, fechada e nunca havia beijado) já havia tido seu primeiro beijo no ano anterior e eu nada. Então "fiquei" (só beijo, ok) com um amigo do irmão dela, em uma viagem a Rio Grande. Não sei o que eu tinha na cabeça. Mas de certa forma, me tirou um peso na consciência e destravou um pouco. Porque, pela primeira vez, permiti que alguém se aproximasse além da minha chamada "margem de segurança".
Me mudei de cidade, emagreci (pela primeira vez tive um peso normal) sem dieta mesmo, não me perguntem porque, mas em pouco menos de 2 anos, lá se foram quase 30 Kgs. Cidade interiorana, nada de stress, muito verde, acho que tudo me acalmou e me fez ficar mais centrada, tirando meu foco da comida. Comecei a ser vista, notada, paquerada e mais alguns beijos aconteceram. Tive namoros rápidos (basicamente pouco mais de 2 meses, ou menos), porque ou me entregava demais e era enganada, ou me entregava de menos e acabava desapegando da pessoa. E curava a dor de um com outro. Até que encontrei meu marido. Ele, sem pretensão alguma de casar, eu sem pretensão alguma de namorar, queria um pouco de sossego. Mas ele me pediu em namoro, resolvi aceitar, não tinha nada a perder. Enfim, cá estamos até hoje.
Voltei a engordar com o passar do tempo, e emagreci novamente pro casamento. É basicamente assim: quando estou magra, me sinto bonita, minha auto-estima fica ótima. Aí engordo, e me trato como uma velha, me detesto, me odeio, não entendo como alguém pode me achar bonita.
Da adolescência pra cá, não mudou muita coisa. Ainda sinto olhares em cima de mim quando vou comer. Mesmo que não existam. Ainda percebo julgamentos com relação ao meu corpo. Ainda ouço comentários sobre o quanto engordei nesses últimos anos (agora um pouco menos porque faz tempo que não vejo quem fazia isso), que nunca estive tão gorda, ainda que de um jeito "delicado". Mil pessoas me dando toques sobre dietas da moda. Ou sabe, aquele dia em que passei em uma construção e ouvi, lá do 10ª andar: "E aí gordinhaaaa!". Humilhante.
Da adolescência pra cá, não mudou muita coisa. Ainda sinto olhares em cima de mim quando vou comer. Mesmo que não existam. Ainda percebo julgamentos com relação ao meu corpo. Ainda ouço comentários sobre o quanto engordei nesses últimos anos (agora um pouco menos porque faz tempo que não vejo quem fazia isso), que nunca estive tão gorda, ainda que de um jeito "delicado". Mil pessoas me dando toques sobre dietas da moda. Ou sabe, aquele dia em que passei em uma construção e ouvi, lá do 10ª andar: "E aí gordinhaaaa!". Humilhante.
Mas sabe, alguma coisa mudou. Acho que o fato de estar me cuidando um pouco mais, me alimentando melhor, está me fazendo bem. A perda de peso é lenta, lenta, mas a cabeça está acompanhando aos poucos. Até pouco antes do post sobre cuidados de beleza, meu único cuidado de beleza efetivo era com os cabelos mesmo. De resto, nada. De vez em quando uma limpeza de pele. Mas comecei a me cuidar, usar hidratantes, perfume. Usar base, um bom rímel, batom bonito. Nada demais, mas que aos poucos estão me fazendo retomar o amor que já senti por mim mesma.
Logicamente, olhando no espelho ainda vejo o quanto estou gorda, baleia, saco de areia. Mas então olho pro meu rosto e vejo a possibilidade por trás dele. Olho pro meu corpo e vejo que ele pode ser melhor, e como ele pode ficar. Passo um bom rímel e observo como meu olhar fica bonito. Um batom nos lábios e me sinto mais mulher. Um esmalte nude nas unhas, brilhosas, me fazem sentir melhor também. Pés macios, pele cheirosa, cabelos brilhantes.
Até meu marido percebeu isso, e está cada vez mais carinhoso. Não que não fosse, mas agora faz elogios todo santo dia, várias vezes, me faz mais carinho ainda, e olha gente, o homem sempre foi um amor, cheio dos cafunés, carinhos e beijinhos no rosto todo.
Sim, estou gorda. Mas hoje, pelo menos hoje, me sinto bonita.
Beijos.