Se 2020 foi como um soco no estômago de quem sobreviveu a ele - literalmente - 2021 não foi mais fácil. Em alguns casos, como o da educação, a readaptação à nova rotina foi ainda mais desgastante.
Um 2021 duro
Eu fui professora de uma turma de alfabetização em 2020. Conseguimos um índice de alfabetização surpreendente com as aulas pelo Zoom + plataforma da rede. Para isso viramos noites e noites e não houve descanso. O resultado, para nós, foi devastador, tanto do ponto de vista físico quanto mental.
Passando o dia todo sentados em frente ao computador, a imensa maioria ganhou peso e acabou sedentário ao extremo. E não, não havia como ser diferente, pois a carga de trabalho literalmente não abria espaço para atividade física.
Isso sem falar da saúde mental, em frangalhos pela pressão - de um lado escola querendo resultados, do outro famílias querendo o mesmo. E isso em um contexto para o qual ninguém estava preparado. Mas fomos lá e fizemos. Infelizmente à custa de nós mesmos.
2021 chegou e com ele o ensino híbrido. A sala de aula com crianças tão pequenas precisando de atenção, e uma câmera aberta ao vivo. Precisávamos dar conta de todos, online e presencial, e manter as máscaras nos rostos de todos os pequenos, evitar o contato entre eles, lidar com um calor absurdo, e mais pressão para dar conta de tudo.
Eu caí. E caí feio.
O começo do fim
No começo eu achava que meu cansaço extremo era resultado de todo o meu sedentarismo e ganho de peso de 2020. E acreditava que o mal estar vinha do excesso de peso.
Eu já havia voltado a usar medicação contra ansiedade há pouco mais de 1 ano. Mas comecei a sentir que ele já não era suficiente, pois eu estava voltando a ter crises de ansiedade logo de manhã. Logo comecei a ter crises no meio da aula. O barulho das crianças me fazia ter a sensação clara de que iria enlouquecer. E haja exercício de respiração.
Fui ao meu psiquiatra, que aumentou a dosagem da medicação e receitou Rivotril para as crises de ansiedade. Acontece que o Rivotril me deixava baleada demais, mesmo sendo uma dosagem super baixa. Então eu não podia usá-lo em qualquer momento.
Então meu corpo começou a dar pane. Primeiro foi uma crise de labirintite leve numa sexta-feira, que me fez vomitar logo cedo e sentir o mundo girando. Faltei ao trabalho e passei o final de semana dopada com Dramin.
Depois minha pressão começou a oscilar - ora baixa, ora um pouco alta. Para mim, que sempre tive pressão baixa, qualquer coisa acima de 12 era um horror. Eu tinha falta de ar, tonturas, náuseas, era horrível. Porém insisti em continuar trabalhando.
Até um dia em que cheguei na escola e, na hora de ir pra sala comecei a ter uma náusea violenta. Um mal estar horroroso. Dei uma olhada de canto pro meu marido e fui correndo pro banheiro. Mas não vomitei, era só o mal estar. Fiquei um tempão até melhorar. E ao meu redor só ouvia o pessoal cogitando uma gravidez. Quem dera...
Eu, que odeio passar mal em público, deitei na sala dos professores enquanto as pessoas me traziam água, água com limão, insistiam para que eu comesse, e eu só queria sair correndo dali. Levei cerca de 1 hora, mas consegui voltar pra sala de aula.
Alguns dias depois, lá estava eu com muito mal estar de novo - eu continuava tendo todos os dias, mas conseguia trabalhar, aos trancos e barrancos. Era tanto que eu, que não posso ter fillhos, fiz 2 exames de gravidez. Fui medir minha pressão, que estava 8 x 6 - e o menino que mediu (formado em enfermagem) chegou a medir mais uma vez para ter certeza. Mas voltei pra sala de aula e toquei o barco.
No dia seguinte, estava sentada na sala dos professores e, ao me levantar, caí sentada no chão. Tudo começou a girar e girar e girar. Deitei no sofá e tinha a sensação de que ia cair dele a qualquer momento. Insisti por quase 2 horas em tentar melhorar - todos tentavam ajudar, água, conversa, até remédio pra labirintite surgiu e tomei. Nada ajudou.
Liguei para o meu marido e fui para o Pronto Socorro da Unimed. Fui atendida rapidamente. O residente que fez as medições iniciais foi muito gentil. Então passei para o médico plantonista que diagnosticou a labirintite. Ele viu minha pressão um pouco alta (13 x 8) e também diagnosticou hipertensão e me mandou ir a um cardiologista. Eu tentei explicar em vão que não sou hipertensa, e que inclusive vinha tendo picos de pressão baixa há semanas. Mas quando você é gordo ninguém te escuta, e deixei pra lá. Precisei de 5 dias de atestado.
No dia que ia retornar à escola eu tive uma crise horrível de ansiedade. Falta de ar, dor na cabeça, amortecimento nos braços e pernas, coração a mil, sensação de angústia, choro convulsivo. Eu já vinha tendo esses sintomas, mas um de cada vez, e mais leves. Dessa vez foi brutal.
Aí eu percebi que precisava de um tempo. Informei a escola e fui ao psiquiatra que disse que eu precisava me ausentar por, no mínimo, 30 dias da escola - ele já havia falado isso no ano anterior, mas eu não quis a licença.
Foi então que eu tirei minha primeira licença-saúde da vida. Diagnosticada com depressão e transtorno de ansiedade generalizada, eu era o Burnout em pessoa. Por 1 ou 2 semanas acordei todos os dias com crise de ansiedade.
O fundo do poço
Pra resumir muito: passei 3 meses de cama, apenas existindo - e algumas vezes não querendo existir. Eu comia, tomava banho, às vezes escovava os dentes e passava na cama. Pensar em voltar para a escola me trazia uma angústia terrível.
Eu queria voltar a trabalhar, mas simplesmente não conseguia nem pensar nessa possibilidade que me dava náuseas. Não que eu odiasse meu trabalho. Jamais. Mas meu corpo parecia travar ao pensar na possibilidade de retornar àquela rotina tão desgastante.
Além disso, fui tomada por um medo terrível do coronavírus, um desespero que não sentia em 2020. O contato com as crianças me mostrou o quanto estávamos vulneráveis, sem máscaras descartáveis adequadas - apenas com nossas próprias - com colegas ficando doentes a cada dia. Foi desesperador.
Dessa vez eu precisei de ajuda psicológica. Nas primeiras sessões com a Ju, eu só queria chorar. Porque por um lado eu queria voltar a trabalhar, me sentia uma inútil em casa. Mas meu lado racional sabia que, ser voltasse, era só questão de tempo até cair de novo.
Eu não via nada além do fundo do poço. Não via como conseguiria melhorar. E estava arrasada por dar tanto trabalho ao meu marido - ele cuidou de mim, da casa, das compras no supermercado, de absolutamente tudo nesse tempo. E sempre me dando ombro nos meus acessos de choro e desespero.
Foi muito difícil. Eu já havia tido momentos depressivos na minha vida, mas dessa vez entendi que a depressão vai muito além da tristeza. Eu sentia um cansaço surreal. Mal tinha forças para levantar da cama, de verdade. Era desesperador.
Mudei de medicação, de dosagens, e enfim mudei de psiquiatra também. Após 3 meses comecei a sair daquele torpor e a conseguir fazer pequenas coisas como acompanhar meu marido no supermercado, nem que fosse só para ficar olhando.
Eu não conseguia tomar decisões, nem sobre que roupa vestir, o que comer. Nada. Mas a cada dia fui melhorando um pouquinho.
Quando consegui uma sanidade mental razoável, decidi que pediria demissão. Tentaria um acordo e daria um jeiro de me virar com o valor da rescisão até encontrar uma recolocação em outra área.
Decidi que não queria mais ser professora. Na escola tentaram me pedir para ficar, me ofereceram outros cargos, mas o ambiente da escola ainda me trazia muita ansiedade. O barulho me deixava muito aflita.
E então, juntei toda a coragem que eu - a dos riscos calculados - nunca tive, e pedi demissão.
E o resto eu contro no próximo post.
Um beijo!
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